Vergonha..... de quê ou de quem?



    Muitas vezes o meu silêncio serve para observar tudo ao meu redor e me ajudar a perceber o meu comportamento e os comportamentos de outros, seja ele individual ou colectivo, não para procurar a perfeição mas para melhorar a minha condição na passagem pela Terra.


vergonha /ô/

ver.go.nha

nome feminino

1. sentimento desagradável relacionado com o receio da desonra ou do rídiculo; pejo

2. timidez; acanhamento

3. ato indecoroso
4. sensação de perda de dignidade ou de falta de valor pessoal, humilhação, rebaixamento
5. desonra; opróbrio

6. rubor nas faces

7. antiquado plural; orgãos sexuais humanos



    É nessas alturas que mergulho fundo, e uso como fio condutor para regressar à superfície, muito do que acontece à minha volta.

    Sem rodeios, vou à infância de cada ser humano, que trás memórias de muitas vidas e de muitas crenças e de muitas experiências guardadas em cada célula do nosso corpo.

    Uma das emoções que contraria e atrapalha a comunicação e expressão de cada um e a sua colocação no mundo, é a vergonha.

    Através de mim e de todas as minha questões que ainda tenho com essa senhora, percebi que a raiz da vergonha está na passagem de informação desde o homem da pré história até hoje, e está muito ligada aos órgãos sexuais. 

    Existem muitas formas cientificas e não cientificas para explicar o aparecimento do ser humano na Terra, mas não é nisso que me vou focar.... vou-me focar nos órgãos sexuais. 

    Ao homem e à mulher é dado o atributo de género masculino e feminino, precisamente por terem constituição física externa distinta (a interna é toda ela muito semelhante), mas energéticamente falando, o ser humano, seja homem ou mulher, carrega em si a energia masculina e feminina em simultâneo

    O encontro em nudez dos dois foi-nos relatado, através da religião, da educação, da familia (muitas vezes), como um ato de vergonha e de superioridade do homem para com a mulher, porque olhando-se de frente um para o outro, encontraram partes diferentes e mais salientes umas que outras... 

    Com tempo e sentindo a necessidade de perceber qual a razão dessas diferenças foram-se tocando em todo o corpo um do outro.... e com isso foi nascendo a sensação do prazer, mas que com os tempos também isso foi banalizado e transformado em sensação de dor nalguns casos.




   Foram escondendo as suas "diferenças" com folhas, e com roupas posteriormente, porque não se sentiam merecedores de tamanha beleza perante o que vislumbravam no outro à sua frente.... mas a parte de cobrir o corpo que concordo na história é que começaram a fazê-lo para se defenderem das diferenças climatéricas. Só. 

Bem... Nesta parte não vou alargar muito!

    O homem e a mulher foram percebendo que, dos órgãos que lhes ofereciam tanto prazer, também eram excretores fisiológicos (ou pelo menos estavam muito perto desses) e que ao sentirem os odores e toda a matéria que sai de si se tornava, algumas vezes momentos de repulsa e não presença do outro, dando lugar a algumas percepções incompreendidas de abandono, rejeição e não aceitação.

    Trazendo a questão para os dias de hoje e para a forma como este assunto é tratado, vejamos o cenário:

    Olhando para um bebé a ser cuidado e olhando para a percepção que fica registada na criança desde o nascimento.

    Pais olham para a zona da cintura do bebé como a zona dos orgãos excretores apenas, e em cada muda de fralda, sai muitas vezes palavras em frases, que dizem de "carinhosas", como por exemplo "Seu porquinho! Sua porquinha! pfffff que mal cheirosa! que mal cheiroso! ´Seu cagão! Sua cagona! Que vergonha! Sujaste as calças! Que feio/a!"

    Não se acanhem.... todos os pais fazem isso, ainda que mecanicamente e inconscientemente, e ainda que não se apercebam do prejudicial que será para o futuro daquela criança e o que estão a plantar na mente dela! Apesar de que quando foi a minha vez de ser mãe evitei ao máximo essa linguagem, precisamente porque tinha esse registo em mim e isso me fez sentir muita vergonha na minha infância que se projectou e gatilhou na minha vida adulta sob forma de medos.... o medo de me expressar em público, o medo de me mostrar, o medo de estar em grupo.

    Foi-me transmitido, por educação primária no seio familiar, que o "pipi e\ o rabinho" serviam só para fazer "xixi e cocó" e que não podia sequer mexer com as mãos a não ser para limpar e lavar, e muitas das vezes que não conseguia controlar o esfíncter eram muitas daquelas frases que eu ouvia, e corriam comigo para a casa de banho para lavar.  Portanto registei aquela zona como sendo a zona suja do meu corpo... 

    A certa altura da minha infância, uma pessoa fora da minha família resolveu cuidar de mim repetidas vezes enquanto os nossos irmãos brincavam na rua, comecei a sentir desconforto porque muitas vezes me tocava na zona que eu considerava suja, mesmo quando eu não precisava de ir à casa de banho!  

                                                      


    Este cenário foi o que deu seguimento ao alimento da vergonha. Se não se podia tocar, porque é que ele estava a tocar tantas vezes?

    E comecei a sentir na pele quando vi a cara de desespero, de revolta, de medo, de raiva e ao mesmo tempo de indignidade e impotência dos meus pais quando um dos meus irmãos relata o que viu acontecer comigo através daquela pessoa.... foi aí que eu percepcionei o quanto grave era a situação, e que afinal não era normal acontecer!

    Num cenário destes quebra-se todo o encanto do ser humano em relação à aceitação do seu corpo, e da projecção de não merecimento de prazer, associado a uma missão muito especifica a aguardar a puberdade, a aguardar a prontidão do corpo para criar uma obra muito maior que si próprios.

    Aos homens, pós adolescência, é dado o registo de que é a semente, e que a qualquer custo, a sua missão é plantá-la no campo uterino da mulher. 
    À mulher, pós a mesma fase, é dado o registo de que o seu corpo só servirá como cama para bebés e para os seus doadores de sementes.

    Não há certo nem errado nisso! É importante é que cada um aprenda a respeitar o templo sagrado do outro, que aprenda a respeitar os ciclo do corpo um do outro, que aprenda a respeitar as crenças uns dos outros... e para mim o ideal seria que cada um pudesse decidir o que quer sentir com o seu corpo e aceitar o outro como alguém que também decide o mesmo.

    Desta feita, o ideal seria ninguém julgar o outro pelo que veste, pelo que come, ou pelo que tem coragem de mostrar, ou pela forma que fala, ou pela forma como gesticula, ou pela forma como se posiciona... em vez de julgar outro, o ideal seria olhar-se a si, e avaliar o que mora dentro de cada um e o que lá foi deixado, o ideal seria ajudar a perceber o que está por detrás da vergonha, e que muitas vezes está relacionada com a autoestima, com o sentir que algo em si está em défice em relação ao outro, que tem defeito e que não é digno de sentir respeito, prazer, amor, alegria. 

    Ao fim das contas.... somos seres completos, temos tudo em nós, tanto perguntas como respostas, tanto situações como soluções. E a resposta a cada comportamento nosso está registado em cada célula do nosso corpo.... e as questões que já coloquei a mim e que me fizeram sair do estado estagnado em que me senti durante alguns anos, foram: 

- Até quando queres continuar nesse modo letárgico? 
- Até quando vais aceitar viver com vergonha de mostrares quem és tu na tua verdade? 
- Até quando vais aceitar seres tudo o que outros querem que tu sejas, quando são centenas os que te rodeiam e que ambicionam coisas tão diferentes de ti?

- O/A Filho/a perfeito/a? A/O Esposa/o perfeita/o? A/O Profissional perfeita/o? A Mãe ou o Pai perfeito? A amiga ou o amigo perfeito? 

                                            
 

    Até essa busca pelo perfeito muitas vezes nos causa vergonha... não conseguir superar as expectativas dos pais, dos amigos, dos colegas, dos professores, dos patrões, dos filhos, dos companheiros/as.


    Descobri uma coisa muito boa nesta minha experiência humana, que sou perfeita dentro da imperfeição que é cobrada por todos esses factores. Toda este busca por mim, por saber o que esperam de mim e pela descoberta de que sou muito grande dentro do pedaço que cada um procura em mim,  tem me ensinado a ser um melhor ser humano, e é uma honra poder facilitar o caminho de outros para sair do seu modo padrão que só lhe promove dor em vez de amor.

    Sou tão rica por poder fazer várias construções em mim com base nos meus mais nobres valores, e por fazer parte deste Universo tão vasto em busca do Amor que me habita desde à milhares de anos através de toda a linha dos meus antepassados.


Gratidão em mim

Sónia Grilo em (Re) Construção do Ser










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