Sê tu Própria!






      Quantas vezes ouvi dizerem-me "SÊ TU PRÓPRIA" ou  então "Vai lá e mostra quem és"? Muitas! Imensas vezes até! 

  Quantas vezes me senti verdadeiramente insegura, rejeitada, abusada, ignorada, abandonada, traída? Também Muitas!!! 

    Mas uma pergunta que eu me fazia nessas alturas e que me vinha em inglês era: "But, who da hell am I? How is like to be me, or myself"?

    Comecei por procurar fórmulas mágicas por todo o lado onde conseguia chegar para perceber como ser "eu própria", mas caí da ilusão... afinal não existiam fórmulas mágicas, apesar dos imensos livros que, de forma metafórica, comi. 

    Rótulos como filha, irmã, aluna, empregada, mãe, esposa, encaixavam todos na condição de mulher que abracei, quando rondei a aura dos meus pais ainda antes da minha concepção (com p). Depois esses nomes passaram a ser usados a seguir aos graus comparativos como " melhor ou pior que" e ainda depois de advérbios de quantidade, mais ou menos, no que tocava ao trabalho que estava por traz de ser cada uma dessas personagens! Que coisa louca! Isso seria ser "eu própria" ou eram protótipos culturais e sociais?

    Até sabermos não sabemos! Até me enfrentar perante um espelho, não me encontrei! Procurei responsáveis pela vida que estava a ter... procurei causas... procurei razões... zanguei-me com Deus... mas só encontrei pessoas! Só encontrei pais, irmãos, professores, amigos, padres, colegas de profissão, comunidades, desconhecidos a fazerem o seu papel por viver dentro da minha vida da única e melhor forma que sabiam!

    Nesta minha jornada olhei muitas vezes para trás, outras fiquei lá a repousar... Ouvia vezes sem conta para não ficar presa no passado, para não me agarrar a ele, para viver em vez de me lamentar, e reclamar (que significa pedir algo mais do que uma vez)... mas na realidade, nessa altura, eu não sabia fazer de outra forma! 

    Olhava muitas vezes para o passado, sem dúvida, foi assim que aprendi a sobreviver,  olhava para trás para fugir dele, para fugir da dor que em tantos momentos senti. 

    Eu pensava que se me escondesse, e depois continuasse a correr para o futuro, eu iria conseguir deixá-lo para trás... deixá-lo sozinho enterrado num cemitério qualquer com gente ainda viva. 

    Hoje percebo que foram muitas coisas deixadas para trás sem lhes fazer um funeral digno, uma cerimónia de desapego, porque eu tinha pressa de sair da dor. 

    Aprendi a olhar para trás, pelos olhos uma nova Sónia... uma Eu adulta que estou a reconstruir como sendo uma peça de arte valiosíssima e raríssima. 

    Agora posso ir lá cada vez que me irritar, que me zangar, que ficar frustrada? Posso! 

    Posso ir lá escutar a criança ferida que fui, ouvir todas as suas lamúrias, e até a posso trazer ao presente e mostrar-lhe como eu estou tão bem a dar conta da minha vida, mostrar-lhe como tudo o que aconteceu não acontece mais, porque agora faço de maneira diferente...

    Mostrar-lhe que agora é seguro estar na minha vida, mesmo quando em criança me senti magoada. 

    Mostrar-lhe que ela agora está bem, protegida, segura, feliz... apesar do caminho ter sido longo e assustador... apesar de ter tido necessidade de fazer uma grande arrumação e limpeza na minha jornada... apesar de ter tido necessidade de, por amor, colocar e reorganizar tanto a minha posição como a de algumas pessoas na minha vida.

   Por vezes ainda me coloco diante de um espelho, de um caderno, ou de uma foto de infância, e tenho uma conversa com a criança que fui. Só com ela! Só nós duas conseguiremos compreender as nossas necessidades! E ás vezes pode ser necessário umas almofadas, um saco de boxe, um espaço largo para deixar o corpo expressar a sua dança, e é ok! É melhor assim do que andar por aí a oferecer galhardetes a quem não entende, ou nem quer entender, nada do que se passa no nosso interior!

    O segredo, é que ninguém tem a capacidade de nos colocar num estado de tranquilidade melhor que nós próprios! Nem o álcool, nem drogas, nem cafeína, nem chocolate, nem produtos químicos... e sim... ensinaram-nos que pedir ajuda é para os fracos, mas hoje sei que são os fortes os que pedem ajuda. São os que querem caminhar junto com outros e serem suportes e escutas para quando não entendemos o que se passa com os nossos sentimentos.

    E foi isso que eu aprendi a fazer desde há 13 anos! Pedi e aceitei apoio para me redescobrir! Para perceber quem sou e qual o meu propósito nesta longa caminhada de cem anos que ainda só vai a menos de meio.

    Pedir apoio é entender que não sabemos ainda como aceder a todas as respostas que estão dentro de cada um. 

    Mas é um percurso solitário, apesar de todo o suporte que se pode ter! Primeiro é pesado, mas com o tempo torna-se leve

    Agora sei onde e com quem quero caminhar pela vida.

    Foram e são muitos mestres os que me ensinam, uns ensinaram pela dor, agora outros ensinam com muito amor.

    E hoje sei que não sou quem alguém quer que eu seja... fui retirando esse poder de quem o reclamou durante o caminho, além de mim.

    Hoje sei que sou a minha melhor escolha, a minha melhor companhia, a minha melhor  mãe e pai, a minha melhor terapeuta, a minha melhor professora, a minha melhor amiga, a minha melhor companheira, porque continuo a aprender, a rodear-me com os melhores de cada, a escolher onde e com quero estar. 

    Hoje sei muito mais de mim do que alguma vez soube!

    Não houve fórmula mágica para me encontrar e me descobrir... ou talvez sim, se a Vontade for considerada como tal.

    Durante a minha fuga da realidade, mergulhei na meditação e em tudo o que fizesse reduzir a velocidade furiosa com que estava a viver, o que me ajudou imenso a ressignificar a ansiedade. 

    Sentia que a minha filha sofria com aquele eu do passado, eu via que ela não era feliz e isso doía-me. A responsabilidade era minha? Não e Sim!

    Percebi que se eu fizesse algo por mim que me ajudasse a acalmar, eu poderia ser uma melhor mãe... porque até ali eu só estava a ser a típica mãe "social" que acartava todos os mundos e todas as culpas às costas (menos o seu)  para ser valorizada, amada e respeitada. 

    Depois a meditação passou a ser pouco, já não chegava para me acalmar (achava eu), fui buscar mais coisas... umas faziam sentido e outras nem por isso... umas abracei e integrei e outras deixei que seguissem o seu percurso. E hoje percebo que todas se complementaram muito bem, na altura e tempo certos. 

    O meu caminho começou a alargar e quase o sinto como uma autoestrada. Tudo passa a correr, tudo acontece a correr, já não há peças repetidas, tudo acontece como novo, e como aceitei a ansiedade, agora pouco trabalho faz em mim.

    "Põe-te a jeito, que a vida também te escolheu!"

    A Vontade fez-me aprender a desapegar de tanta coisa, que se fosse numerar agora, precisaria de muito mais espaço para aceitar e deixar ir as críticas de quem possa ainda não ter acordado para esta velocidade louca em que a vida está a acontecer.

    Por isto aceitei a urgência de olhar de uma forma diferente para trás, como muuuiiiita terapia, de dar novos sentidos às mortes e perdas em vida, aos lutos não feitos, de deixar ir a mágoa que o inconsciente escondia e viver desde um novo Eu, entregando e devolvendo a cada um as suas bagagens e refazendo a minha mala apenas com o que me pertence. Colocar ordem naquilo que posso ordenar, colocar um sentido naquilo que vou sentido, colocar prazer em tudo o que vou vivendo. 

    Hoje sento-me na cadeira do Respeito porque encontrei a Dignidade e o Amor outrora perdidos nas vidas de outros onde me tentei encaixar em dor por amor.

    Hoje, sinto-me assim como que um presente que Deus ofereceu a este mundo! Por isso o meu propósito para esta vida, que me foi tão generosamente oferecida, é VIVER!

Reconstruindo o meu próprio Ser

Sónia Grilo


Comentários

Mensagens populares deste blogue

Toque Consciente Afetuoso

Aftas